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Visibilidade trans: a importância de políticas afirmativas

Violência, hostilidade e preconceito. Essa é a realidade vivenciada cotidianamente por milhares de pessoas transexuais, especialmente quando inseridas no país que mais mata travestis e transexuais do mundo - o Brasil. Os relatórios Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) demonstram uma realidade alarmante, em que o número de assassinatos dessa população cresce a taxas exorbitantes, ano após ano. Nesse sentido, torna-se essencial o debate não apenas em relação à segurança e visibilidade da população transgênero, mas também sobre a centralidade na política em meio a essas discussões.

É incontestável afirmar que o gênero da maneira binária como conhecemos hoje - masculino e feminino - é uma construção social, que atribui determinadas características e funções, tanto sociais quanto econômicas, a cada um desses gêneros. Um exemplo disso, por exemplo, são os trabalhos de reprodução social, como cozinhar e limpar a casa, tradicionalmente associados ao gênero feminino. Entretanto, Engels (2019) demonstra como essa relação é construída e consolidada na sociedade moderna, de forma que outras culturas pré-capitalistas possuíam anteriormente uma outra relação com o gênero. Silvia Federici, em sua obra Calibã e a Bruxa, demonstra também como a construção moderna das categorias binárias de gênero cumpre uma função social e econômica. Associar determinados papéis ao gênero gera uma obrigatoriedade social de se cumprir tais funções, contribuindo assim para um maior controle da sociedade em diversas dimensões, como a reprodução social.



Para além da construção desses papéis de gênero, emerge uma necessidade de se condenar socialmente todas as formas de se exercer o gênero e a sexualidade que destoam daquilo que é imposto pelo status quo. Nesse sentido, a transexualidade passa a ser condenada de maneira hostil e agressiva, resultando hoje nas 140 mortes de pessoas transexuais e travestis no Brasil, no ano de 2021. Além da extrema violência física, há também um processo de violência psicológica continuada, marcado pela hostilidade e pela negação do acesso aos espaços públicos. Os relatos de mulheres e homens transexuais revelam as diversas formas pela qual esse preconceito se manifesta, como a dificuldade de inserção no mercado de trabalho e na construção de relacionamentos interpessoais.

Transformar essa trágica realidade exige uma atuação em múltiplas frentes. Em um sentido mais amplo, é necessária uma completa reorganização do sentido socialmente conferido ao gênero, de forma a quebrar os papéis atribuídos ao que conhecemos como masculino e feminino. A própria existência dessas categorias é algo a ser constantemente desafiado rumo a uma nova forma de se compreender os indivíduos. Entretanto, é urgente também uma atuação política que busque sanar problemas imediatos aos quais estão submetidos a população transexual brasileira. Políticas afirmativas, como a Lei de Cotas para pessoas travestis e transexuais nas universidades públicas, são essenciais nesse sentido. Por mais que, nos últimos anos, tenha se avançado consideravelmente nos debates em relação tanto ao gênero quanto à sexualidade, permanecemos ainda um país que julga, agride e assassina a população trans.


Julia Maciel Augusta Morato

Ciências Econômicas - UFMG

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Referências:


Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra). 2020. Dossiê assassinatos e violências contra travestis e transexuais brasileiras em 2021. Disponível em: https://antrabrasil.files.wordpress.com/2022/01/dossieantra2022-web.pdf

Engels, Friedrich. 2019. A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado. São Paulo: Boitempo.

Federici, Silvia. 2019. Calibã e a bruxa: Mulheres, corpos e acumulação primitiva. São Paulo: Editora Elefante.





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